3 de out. de 2021

Modelos de Competência Digital Docente. Parte II

Na primeira parte desta série mostramos vários modelos de CDD: da UNESCO (2008), o modelo SAMR (Puentedura, 2013), a versão dele elaborada por Nicolau (2017), o modelo de Krumsvik (2011) e o modelo TPACK (de Mishra e Khoeler, 2006), somado à adaptação  do TPACK feita por Abio (2018) para o trabalho em um curso com infográficos.

Agora, nesta segunda entrega, apresentaremos o modelo proposto pelo CIEB (2019), assim como o modelo Four in Balance. Também o modelo PEAT (DICTE, 2019), o modelo MCompDigEAD de Silva (2018) e concluímos esta segunda parte com os padrões do ISTE (International Society for Technology in Education).

Parece muito? Na realidade, veremos mais modelos nas partes seguintes da série, mas vamos começar já, que o caminho é longo: 


7A - Modelo do CIEB

O Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB) lançou em maio de 2019 a nota técnica #15 'CIEB Notas Técnicas: “Autoavaliação de Competências Digitais de Professores”' (CIEB, 2019) e um Guia de Autoavaliação  em forma de ferramenta de autoavaliação on-line e gratuita, desenvolvida a partir de uma Matriz de Competências "que elenca o que é necessário para que o docente faça uso efetivo da tecnologia, tanto para suas atividades de ensino, no contexto escolar, quanto para sua própria aprendizagem, em seu processo de atualização e desenvolvimento profissional" (CIEB, 2019).

O guia de autoavaliação possui 23 perguntas que avaliam doze competências em total reunidas em três áreas: pedagógica, cidadania digital e desenvolvimento profissional (ver Figura):

fonte: https://guiaedutec.com.br/

Para avaliar o desenvolvimento de cada competência, foram elaborados cinco níveis de apropriação (exposição, familiarização, adaptação, integração e transformação) e seus respectivos descritores, que servem para evidenciar a progressão digital do docente.

Cada nível de apropriação é explicado da seguinte forma:

EXPOSIÇÃO - Quando não há uso das tecnologias na prática pedagógica ou quando o professor requer apoio de terceiros para utilizá-las. E também quando o uso é apenas pessoal. O professor identifica as tecnologias como instrumento, não como parte da cultura digital.

FAMILIARIZAÇÃO - O professor começa a conhecer e usar pontualmente as tecnologias em suas atividades. Identifica e enxerga as tecnologias como apoio ao ensino. O uso de tecnologias está centrado no professor.

ADAPTAÇÃO - As tecnologias são usadas periodicamente e podem estar integradas ao planejamento das atividades pedagógicas. O professor identifica as tecnologias como recursos complementares para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem.

INTEGRAÇÃO - O uso das tecnologias é frequente no planejamento das atividades e na interação com os alunos. O professor trabalha com as tecnologias de forma integrada e contextualizada no processo de ensino e aprendizagem.

TRANSFORMAÇÃO - Quando o professor usa as tecnologias de forma inovadora, compartilha com os colegas e realiza projetos colaborativos para além da escola, mostrando-se maduro digitalmente. Ele identifica as tecnologias como ferramenta de transformação social (CIEB, 2019,  p. 14).


Cada nível de apropriação de competências digitais pode ser descrito em até três aspectos:

1) Fluência no uso de tecnologias digitais (são as evidências do uso de tecnologias no contexto pessoal e pedagógico);

2) Integração das tecnologias digitais ao currículo (evidências do uso de tecnologias alinhado aos documentos orientadores da rede de ensino e da escola);

3) Empoderamento dos alunos: evidências da participação ativa dos alunos nos processos de ensino e de aprendizagem com o uso de tecnologias) (CIEB, 2019, p. 15).

Este modelo de guia do CIEB pensado inicialmente para professores da Educação Básica foi adaptado e utilizado por primeira vez com docentes universitários na avaliação de competências digitais que realizamos na UFAL de forma emergencial em abril de 2020 e que foi respondida por 384 docentes.

Os resultados mostraram que a maioria dos professores da UFAL estavam  nos níveis de familiarização e adaptação no início da pandemia de COVID-19.


Por meio do acordo de cooperação técnica firmado com o Ministério da Educação (MEC), o Guia Edutec Diagnóstico foi integrado à plataforma digital do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE Interativo). Com isso, a ferramenta obteve, em 2022, seu maior número de respostas, alcançando 75% das escolas públicas brasileiras. A partir dos dados que foram extraídos desse período, o CIEB publicou o Relatório Guia Edutec - Diagnóstico do Nível de Adoção de Tecnologia nas Escolas Públicas Brasileiras em 2022, um retrato da adoção de tecnologias na educação pública brasileira.

7B- Modelo Four in Balance (KENNISNET)

Entre os modelos estudados por Almeida e Valente para o relatório para CIEB, os autores decantam-se pelo modelo Four in Balance, desenvolvido em 2001 pela Fundação TIC para a  Escola,  da  Holanda,  atualmente  conhecida como Fundação Kennisnet.

O modelo Four in Balance tem sido utilizado tanto no desenvolvimento quanto na avaliação de situações educacionais visando ao uso eficaz e eficiente das TIC na educação.

Ele é composto de dois elementos, humanos e tecnológicos, sendo que o elemento humano é constituído por dois eixos -visão e competência-; e o elemento tecnológico, pelos eixos conteúdos e recursos digitais, e infraestrutura

 Modelo Four in Balance, da Kennisnet (ALMEIDA, VALENTE, 2016, p. 31).


Os quatro eixos mencionados no modelo devem ser alcançados em uma perspectiva de equilíbrio entre eles e perpassados transversalmente por um eixo constituído por currículo, avaliação e pesquisa (p. 36).


Referências

ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de; VALENTE, José Armando.  Políticas de Tecnologia na educação Brasileira. Histórico, lições aprendidas e recomendações. CIEB Estudos #4, 2016. http://cieb.net.br/wp-content/uploads/2019/04/CIEB-Estudos-4-Politicas-de-Tecnologia-na-Educacao-Brasileira-v.-22dez2016.pdf

BITTENCOURT, Ig Ibert; PIMENTEL, Fernando; SALMOS, Janaína; ABIO, Gonzalo. Avaliação diagnóstica de Competências Digitais de Professores(as) da UFAL. UFAL@Conectada; CIEB, NEES; Comunidades Virtuais Ufal, 2020.

Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB). Autoavaliação de Competências Digitais de Professores. CIEB Notas Técnicas # 15, 2019. http://cieb.net.br/wp-content/uploads/2019/06/CIEB_NotaTecnica15_junho_-2019.pdf

Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB). Relatório guia Edutec: diagnóstico do nível de adoção de tecnologia nas escolas públicas brasileiras. Centro de Inovação para a Educação Brasileira. São Paulo: CIEB, 2O22. https://cieb.net.br/wp-content/uploads/2022/12/2022-12-12-Relatorio-Guia-Edutec.pdf


8- Modelo MCompDigEAD (SILVA, 2018)

Silva (2018), também no contexto brasileiro, desenvolveu o chamado Modelo de Competências Digitais em Educação a Distância (EAD) (MCompDigEAD) que compreende três competências digitais: Alfabetização Digital, Letramento Digital e Fluência Digital, com  quatorze competências específicas detalhadas através dos conhecimentos, habilidades e atitudes (CHA), totalizando 328 elementos.

Este modelo foi desenvolvido pensando nos alunos que estudam na EaD, mas a compreensão do modelo pode ser útil também para o docentes.

fonte: Silva (2018, p. 205). Observação: o esquema foi levemente refeito para melhor visualização neste livro.

Neste modelo cada competência específica possui três níveis de proficiência: inicial, intermediário e avançado.

A autora oferece exemplos de casos de uso em cada nível de proficiência considerando o cenário dos alunos que estudam em cursos a distância, mas podemos pensar que este modelo pode ser utilizado também em qualquer cenário de ensino híbrido.

Na realidade este modelo parece muito útil, mas ainda não é muito conhecido.

No caso do nível superior do modelo, chamado pela autora de Fluência Digital, aparecem cinco competências específicas (produção de conteúdo, proteção de dados, convivência em rede, resiliência virtual e trabalho em equipe).

Por exemplo, no item correspondente com a "Criação e desenvolvimento de conteúdo digital" aparecem nos três níveis de proficiência os seguintes elementos:


Referência

SILVA, Ketia Kellen Araújo. Modelo de Competências Digitais em Educação a Distância: MCompDigEAD – Um foco no aluno. Porto Alegre, 2018. 279f. Tese (Doutorado em Informática na Educação) – Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2018. https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/180549

SILVA, Ketia Kellen Araújo da; BEHAR, Patricia Alejandra. MCompDigEaD. Modelo de Competências Digitais em Educação a Distância com foco no aluno. Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação, Universidade Federal  do Rio Grande do Sul, Nuted, 2018. http://nuted.ufrgs.br/MCompDigEAD.pdf

 

9- Modelo PEAT do grupo DICTE

O nome do modelo PEAT  provêm das dimensões incluídas nele: Pedagógica, Ética, Atitudinal e Técnica (PEAT).

Este modelo foi desenvolvido pelo grupo DICTE (Developing ICT in Teacher Education), um grupo formado por pesquisadores da Noruega, Espanha, Malta e Irlanda.

Este modelo PEAT conceitualiza a competência digital de professores e alunos por meio de quatro dimensões igualmente importantes.

A dimensão pedagógica incorpora práticas pedagógicas que a tecnologia pode oferecer a diferentes disciplinas específicas, como também a práticas profissionais mais amplas.

A dimensão ética inclui questões relacionadas à privacidade, direitos autorais, críticas sobre as fontes utilizadas, liberdade de expressão e ética pessoal relacionada ao entendimento e uso profissional da tecnologia digital.

A dimensão atitudinal inclui a capacidade de adotar e adaptar novas tecnologias em um contexto profissional, para poder usar de forma criativa as tecnologias digitais como apoio a processos de ensino e aprendizagem ou em contexto profissional, além de formar uma profunda compreensão do papel das tecnologias digitais na sociedade.

A dimensão técnica refere-se às habilidades práticas e competências necessárias para usar software e hardware em situações educacionais específicas, bem como ao entendimento de redes tecnológicas e ao conhecimento de como os dispositivos digitais operam e se comunicam entre si.

Referências

DICTE. Pedagogical, Ethical, Attitudinal and Technical dimensions of Digital Competence in Teacher Education. Developing ICT in Teacher Education Erasmus+ project, 2019. https://dicte.oslomet.no/2019/11/03/dicte/


10- ISTE - International Society for Technology in Education

ISTE  - Standards for educators

O   referencial   da  International Society for Technology in Education (ISTE), possui um roteiro informativo para educadores de todo o mundo, visando apoiar nas decisões sobre currículo, ensino ou aprendizagem profissional   e   sugerindo   como   transformar   as   práticas   pedagógicas   para   uma aprendizagem mais significativa, com o apoio das tecnologias.

O objetivo amplo   do   documento   é   o   de  desenvolver  e   partilhar,   mundialmente,  padrões   de competências digitais para aprender, ensinar e liderar na era digital. O documento apresenta sete padrões que são indicativos do papel dos educadores como agentes de mudança para a aprendizagem.

Na representação a continuação podemos ver do lado esquerdo os padrões ISTE para educadores, enquanto no lado direito estão que são para os estudantes.


Referências

LOUREIRO, Ana Claudia; MEIRINHOS, Manuel; OSÓRIO, António José. Competência digital docente: linhas de orientação dos referenciais. Texto Livre: Linguagem e Tecnologia, v. 13, n. 2, jul. 2020. http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/textolivre/article/view/16909

ISTE. Padrões ISTE (em português)

ISTE. Condições essenciais para aproveitar a tecnologia de forma efetiva para a aprendizagem (inglês ou espanhol).


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3 comentários:

Gonzalo Abio disse...

Não podemos ter avanços no letramento midiático e digital ou nas competências digitais dos alunos e docentes sem uma infraestrutura adequada, suficiente e duradoura nas escolas (ver, por exemplo, a dimensão de infraestrutura no modelo Four in Balance (da Kennisnet). Veremos de perto o que acontece na prática com a nova Política de Inovação Educação Conectada expressa na Lei nº 14.180, de 1º de julho de 2021.
Ver em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.180-de-1-de-julho-de-2021-329472130

Gonzalo Abio disse...

Publicação recente sobre Competências digitais: Pedro, Neuza; Santos, Cassio; Mattar, João (coords.). Competências Digitais: Desenvolvimento e impacto na educação atual. Instituto de Educação, ULisboa. Coleção Educação XXI, 2023.
http://www.ie.ulisboa.pt/publicacoes/ebooks/educacao-xxi/competencias-digitais-desenvolvimento-e-impacto-na-educacao-atual

Gonzalo Abio disse...

Quando vi o documento espanhol BOE-A-2022-8042 entendi por que não sabemos nada de Competências Digitais Docentes e sempre batemos na mesma tecla. rsrsrs Tantos tópicos e níveis são muito bonitos no papel, mas nem tanto na prática rsrsrs https://www.boe.es/eli/es/res/2022/05/04/(5)
https://www.boe.es/diario_boe/txt.php?id=BOE-A-2022-8042